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A vida de Mala Aviada

A vida de Mala Aviada

PK - a fatiga do espírito

  
 
Será que um quadro nasce de um acto único? Não, constrói-se peça a peça, tal como uma casa.
 
E o observador consegue apreender o quadro com um único olhar? (Muitas vezes sim, infelizmente.)


Feuerbach não disse que é preciso uma cadeira para ver um quadro? Para quê uma cadeira? para que as pernas cansadas não perturbem os espírito. As pernas cansam-se se estivermos muito tempo de pé. Temos, então, o espaço da acção: o tempo. Natureza: movimento. Só o ponto morto é intemporal. Também no universo é o movimento é o movimento que conta.
 
Paul Klee


 

Vírgulas de desejos. Rita, stop moving.

Would you stop moving? Would you?

Podias para de te mover pelo mundo, Rita.

Porquê? Porque preciso de ti, ora essa.

Rita? Pára! Pára agora de circundar, pára e fica aqui. Olha para as gotas de água que caem do céu cinzento negro. Não são bonitas?

Hoje aprendi, Rita. Aprendi que se estiver com muita vontade de fazer quaqluer coisa devo fazê-la, mas se não estiver, então, pelo contrário, devo manter-me afastada. Sabes porquê Rita? Deixa-me frustrada. E tu sabes bem como fico quando me irrito. Sabes ainda, não sabes? Tu lembras-te Rita? Aqueles ataques de stress que me davam e depois me empurravam para o calor e conforto do teu abraço? Eram esses. Agora, Rita, são piores. Entro em pânico e sinto-me à beira do abismo: em parte a culpa é tua. Não que queira atirar-te as culpas para cima - longe de mim culpabilizar-te por isto!- porque sei que é a palavra que nos separa. Mas fico assim porque não páras de te mexer, Rita.

Estou há mais de 24h no mesmo sítio, sem fazer movimentos bruscos e sem pisar linhas imaginárias limtadoras de campos coloridos mas perigosos: como uma pintura fauvista  ou expressionista de um primiero grupo alemão e ainda espero por ti. Ouço a tua voz em repetição constante em mim, mas não te vejo: é como se estivessemos a brincar a um jogo às escuras onde também não posso usar as mãos. Mas eu não pedi para jogar este jogo, Rita! Eu não queria e tu também não.

Não pois não? Como quando dizes não para não te reencherem o prato de comida. Ou não quando cruzas os braços e bates o pé. Ainda bates o pé, Rita?

Disseste que sim, que sim. Esta semana podemos aproveitar o desconto que temos para nós próprias e comprar o nosso mimo. Vamos não vamos? Eu juro que te dou chocolate Milka e pão de cereais; até te faço o pequeno almoço de regresso a casa com Muffin de frutos silvetres. Deixo-te enrolares o Jerónimo no teu corpo e terme-ás por ali, á tua volta com beijinhos e xi's do tamanho ... dos meus braços. Mas Rita, preciso que voltes para poder fazê-lo. Preciso que voltes para não me sentir só, para não me sentir à deriva num quadro que não gosto.

Sabes, o Rothko pintava de maneira a que o espectador se sentisse parte da sua pintura colorida. Preciso que me faças sentir parte da pintura. Não só o pincel, também a pincelada. Porque no final de contas, Rita, a pintura e o amor não devem ser como o McDonalds. Quando voltas, Rita? Would you stop moving?

 

 

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Glas or glass or, still, glad. The last one.

 

    E um sorriso pelos contornos dos teus olhos desenha-se; um sorriso que vem com um ensonado "Bom dia!" mas bem disposto. Respondo num monotonia de voz quase irritante de tão alegre ser. O meu cabelo espalha gotinhas de água de tamanhos diferentes e variados na tua pele morena natural enquanto te beijo o nariz e a testa e as bochechas e o espaço entre o teu nariz e a tua boca bem delineada. Fazes uma expressão que me faz pensar que tudo até agora tem valido a pena, mesmo que às vezes tenha sido pior - de uma forma ou de outra.
      Ver-te despertar na cama sem teres noção das horas, do tempo e da intensidade de luz que está lá fora faz-me dar utilidade às primeiras palavras da manhã que se dividem entre: " queres pequenalmoçar na cama ou arranjar-te primeiro?" - mas o que decides convence-me de uma maneira muito mais fascinante. As tuas mãos passam para baixo da minha camisola azul londrina e sobrevoam a minha pele ao mesmo tempo que os dedos fazem pequenas e delicadas aterragens que me dão minutos de prazer tão grandes que não caberiam nos bolsos das nossas calças de viagem nem nos bolsos das mochilas ainda por desempacotar todos juntos.
     Rebolo para junto do teu corpo mais desperto que na passada noite aquando do regresso a casa e tu, sem demorar muito, despes o que acabava de vestir com mestria, destreza, facilidade e delicadeza.
Amo cada gesto que fazes e desenhas sobre as linhas da minha pele: suspiro, deixo-me levar. Deixo que me dês o mundo de mão beijada, deixo que me faças aproximar mais um pouco da textura das nuvens, da cor do céu. Deixo que te reconheças através de mim.

 
    Lembro-me que há uns anos atrás esperei para que alguém entendesse o que seria o despertar matinal com alguém certo. Acho que isso se sabe a partir do instante em que se olha à nossa volta e nada mais valha tanto quanto o primeiro momento do dia da outra pessoa. E lembro-me, passado anos a acordar na tua presença, que tudo se cinge ao momento único matinal e aos minutos que o seguem - e no nosso caso, todos eles (ou quase todos), muito singulares de formas dispares e convincentes, acrescentando sempre uma nova tonalidade de cor aos círculos do nosso mundo.
Envolvo-te nos meus braços agora. Deixo que pouses a tua cabeça no meu peito, sentindo a oscilação da minha respiração e o meu batimento cardíaco. Com a minha mão esquerda faço gestos repetidos que teimam em aquecer-te  a pele mais um bocadinho.
 
    Ouço um suspiro; ouço a tua voz seguindo-o. E harmonia, de novo. "Amo-te com todas as letras, amo-te com tudo o que sou de ponta a ponta." Em resposta, sorrio e penso em grãos de açúcar, pacotinhos cheios deles... cheios, a transbordar! "Dia sim, dia sim. Todos os dias e mais um.". Sei que valeu a pena esperar anos. Sei que valeu a pena passar pelo muito e pelo pouco para agora poder ter tudo o que fazia sentido e continua a fazer.
    Enrolas as tuas pernas nas minhas e eis a resposta: pequeno-almoço na cama.
    Era o que esperava.

 

 

1406904

Entre espaços não existe mais nada. Só vácuo.

Se não vens *amanhã* deixa de haver produção de pão de sementes, de energia eléctrica, de chocolate, de passos na rua, de Ricola laranja, de leite achocolatado em pacotes individuais, de edições do Público, de gaivotas a voar, de reciclagem a acontecer, de cafés aromáticos, de viagens de comboio, de invasões de pioneses e de camas a serem desfeitas. Queres parar assim o mundo?

 

 

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Coordenação In.S. -

 

 

A chuva caía sobre mim e a sensação de preenchimento era quase insatisfatória: não há uma única pontinha de mim que não sinta a tua falta nestes momentos.

Não há uma pontinha de mim que não sinta a tua falta a qualquer parte do dia.

A vontade de fazer muitas das coisas necessárias é anulada sem a tua presença. Sinto o mundo a rodar mais devagar sobre os seus eixos, sinto o pesar do ar e do cansaço de regressos constantes sem calor humano. Coordenação fraca reclamas tu: concordo. E concordo que todos os dias, Rothko é parte da realidade, tu parte intrínsseca da minha vida e café com leite parte da vida que escolhi.

Faz sentido dançar na chuva sem o som do teu riso? A mola que desenho técnicamente diz que não deveria tentar, porque tal como ela tem duas partes integrantes e sempre juntas, também eu deveria ter a minha parte integrante dançante na chuva.

O frio constrói os meus pés e a ponta das minhas unhas: mais arte do que aquilo que sonho, mais Karma do que aquilo que pode existir. Coordenação insuficiente. 

Na ponta dos meus dedos e no princípio do fim do mundo.

Ando às voltas e às voltas com cadernos, canetas, lápis e lapiseiras. Clips!

Os post-its amarelos colam-se em livros, requerem atenção da minha parte e a caneta Pilot está exausta. A caneca veio pela quarta vez consecutiva até à mesa da mobilidade - onde faço tudo: como, trabalho, leio, imagino, namoro, falo, entristesso-me... E pela quarta vez vem cheia, mas desta vez com cereais nostálgicos - o mundo fica numa pontinha de um dos meus dedos e o resto é arte. As listas crescem de novo, a agenda está lotada de serões intermináveis, a minha letra foge da capacidade de ser lida. As novas aquisições de leitura já foram arrumadas no seu lugar e o habitáculo do jazz está mais morno. Procuro de novo a Mebocaína Forte e tento encaixar o resto do mundo noutra ponta de um dedo. Reparei agora: não dá: o resto é arte.

 

 

 

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